Diretor do World Tour critica patrocinadores como Emirados Árabes e Red Bull “em nome do dinheiro, sacrificamos muitos valores”
A situação envolvendo a quebra de contrato unilateral, de Maxim Van Gils frente a sua equipe, a Lotto Dstny causou um grande impacto, não apenas no ciclismo belga, mas em todo o cenário internacional. O provável destino do belga seria a alemã Red Bull Bora-hansgrohe, que teve um aumento significativo de orçamento, após a entrada da marca austríaca como um dos principais patrocinadores.
O mais recente a comentar sobre o caso é Marc Madiot, CEO da equipe francesa Groupama-FDJ, que vê o episódio como reflexo das transformações no pelotão.
O experiente dirigente também aproveitou para criticar o papel de grandes patrocinadores “estrangeiros”, como os Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Red Bull que patrocinam três das principais equipes do World Tour.
“A ascensão de grandes estruturas financeiras não é boa”
Para Madiot, o episódio de Van Gils serve como um alerta sobre o futuro do ciclismo. “O que acontece com Maxim Van Gils não é um bom presságio para o futuro. A ascensão de grandes estruturas financeiras não é boa para as nossas relações com o que chamo de patrocinadores tradicionais do ciclismo”, declarou o dirigente à rede belga RTBF.
O francês de 65 anos destacou que, embora patrocinadores estatais como os Emirados Árabes Unidos, Astana e Bahrein tenham trazido novos recursos ao esporte, sua permanência é incerta. “Eles não estavam lá antes e podem não estar lá depois de amanhã”, alertou.
Em contraste, Madiot elogiou os patrocinadores tradicionais, que têm uma relação mais estável com o ciclismo. “Ainda temos um grupo de patrocinadores que são fiéis ao ciclismo há vários anos, como as loterias belga e francesa, Cofidis, Quick-Step e outras.”
“Se esses grandes gigantes partirem, o que restará?”
Os chamados patrocinadores tradicionais enfrentam dificuldades para competir com os enormes recursos financeiros que invadiram o pelotão nos últimos anos. “Nossos patrocinadores não são obrigados a ter uma equipe de ciclismo. Não é função deles ter uma equipe de ciclismo. Então temos que ter muito cuidado com isso”, explicou Madiot.
Ele reconheceu a importância dos grandes patrocinadores internacionais, mas defendeu a criação de regulamentações. “Não tenho nada contra a chegada de grandes patrocinadores como Red Bull, Emirados Árabes Unidos ou Bahrein, mas ainda precisamos adicionar um mínimo de regulamentação. Porque no dia em que esses grandes gigantes partirem, porque eles podem fazer isso, o que restará?”
“Em nome do dinheiro, sacrificamos muitos valores”
Embora o aporte financeiro dos novos patrocinadores traga benefícios imediatos às equipes, Madiot acredita que o impacto a longo prazo pode ser prejudicial. Ele também criticou o que vê como motivações questionáveis de alguns investidores.
“Em nome do dinheiro, sacrificamos muitos valores. E além disso, temos pessoas com recursos que procuram outra coisa, não o retorno do investimento, mas para dar um soco, para esmagar o mercado, para dominar o tempo que quiserem e depois deixá-los para trás. Isso causa danos”, afirmou.
Hoje é a Lotto, amanhã pode ser a Quick-Step
Cada vez mais ciclistas optam por salários maiores em equipes de ponta, deixando para trás as equipes onde cresceram. “Perder ciclistas faz parte da vida de uma equipe. Isso virou moda em muitas organizações. Quase todos nós temos que lidar com isso”, lamenta Marc Madiot, visivelmente preocupado.
Madiot destaca que a decisão de Maxim Van Gils pode ter um impacto significativo não só na Lotto Dstny, mas também no ciclismo belga como um todo. “A Lotto Dstny precisa desse ciclista, com quem assinou um contrato. Coloco-me no lugar deles: é uma equipe que está no ciclismo há décadas, investindo recursos e desenvolvendo talentos”.
“Eles têm a oportunidade de moldar um grande ciclista como Van Gils, mas de repente, por algum motivo, ele quer sair. Essa atitude coloca em risco tudo o que a Lotto construiu no ciclismo belga. Hoje é a Lotto, mas amanhã pode ser a Quick Step ou qualquer outra equipe. Já vivi isso antes. Estamos enfrentando um problema sistêmico.”